domingo, 11 de março de 2012 1 comments

Diálogos

Vovó: Onde eu estou?
Cuidadora: Mmmm... deixa eu pensar... no Japão.
Vovó: Ai que bom, sempre quis paquerar um japonês.




Nora: Onde a senhora quer ir hoje?
Vovó: Pro céu.
Nora: O que a senhora quer fazer lá no céu?
Vovó: Um cafezinho pro São Pedro.




Hoje me perdoo muito mais, me exijo muito menos.
 Só sei te dizer que a vida simplificou
(Drica Moraes, na Folha)
domingo, 4 de março de 2012 0 comments

(A)traídos pelo vulcão

Há cerca de dez anos, fiz minha primeira viagem ao Chile. Destino: os grandes lagos e os vulcões de Pucón, além, é claro, de uma passadinha por Santiago. Embora as pessoas costumem fazer esse tipo de viagem no verão, decidimos viajar em julho para aproveitar o inverno.

Ao ver o Aconcagua ainda do avião, desejei ser mais forte, mais aventureira para poder caminhar até o topo. Um daqueles sonhos que é melhor não realizar, né? O meu passeio era bem mais modesto: caminhamos pelas ruas e parques de Santiago. Um senhor varria as folhas que insistiam em cair das árvores do parque. E jovens vendiam na rua poesias para pagar a faculdade e protestar contra o poder disfarçado do exército. Nas livrarias, gramáticas, dicionários e outros livros sobre língua e cultura Mapuche. Nas feiras, artesanato. Uma cultura combativa, apesar da repressão.

E então pegamos um trem para Temuco. Queria ver a noite chilena, mas um funcionário metido a general de Pinochet simplesmente fechou todas a cortinas: sem discussão! que fique bem entendido. De Temuco, seguimos para Pucón, onde alugamos um chalé de madeira. Primeira lição, jamais aprendida: como manter funcionando durante a noite o aquecedor à lenha? Mas quem se importa com o frio, quando há tremores à noite. "Ah... Isso que é um terremoto... Tranquilo" - lembro-me de dizer ainda sonolenta. No dia seguinte, o estrago que o terremoto tinha feito em uma plataforma no lago me deixou mais assustada.

Chovia muito em Pucón. Os dias pequenininhos, a chuva, bons vinhos. Ah... E o Chez Patto, na rua principal: um pãozinho quentinho da lareira, com um molho apimentado. Delicioso! Após três dias, a chuva deu uma trégua e pudemos seguir para o vulcão.

A vegetação vai se tornando escassa, o cinza das pedras vulcânicas invade a paisagem até que tudo é coberto pelo gelo. Pouco à frente, os restos de um elevador para esqui: a estação havia sido desativada na última erupção do vulcão, contou o guia. Um pequeno treinamento, indicava como usar as ferramentas para caso de queda no gelo. Preferencialmente, não cair, afinal com o nervosismo de uma queda, dificilmente um escalador de primeira viagem lembraria da lição.

A caminhada em zigue-zague era extremamente cansativa. Apenas algumas pedras para apoiar. A vista dos dois outros vulcões valia o esforço. Em certo ponto, o guia percebeu que eu não poderia mais continuar. Estava exausta. O grupo seguiu um pouco à frente e eu fiquei sentadinha esperando que eles retornassem. O silêncio, o céu azul, o gelo da montanha, os dois vulcões à frente. A câmera era incapaz de captar o que os olhos viam. E o silêncio, a sensão de morte, de paz. Até que o silêncio foi quebrado por um condor (?). Lindo, enorme, imponente, desprovido de qualquer medo, como se eu fosse apenas mais uma rocha em meio ao branco da montanha.

Não sei quanto tempo se passou até que voltaram. Não foram até o topo do vulcão, porque eu não poderia voltar sozinha, mas creio que demoraram. Não consegui me levantar, as pernas simplesmente não reagiam. O guia me ajudou a levantar e, apoiada nele, desci. 

Até ontem,  pouco refleti sobre os ricos que assumi ao viajar para o vulcão. Simplesmente, vulcões me atraem: a beleza das fotos da Islândia, o silêncio do Villarica. Ontem, um brasileiro chamado Felipe foi encontrado no Villarica. Como ele, muitos outros partiram. Estima-se que entre 1980 e 2002, 34.000 pessoas morreram observando a cratera de algum vulcão - apenas 23 eram cientistas; os demais, turistas (cf. Volcano online). Eu nunca cheguei a ver a cratera . Provavelmente, jamais a verei. Mas continuo irremediavelmente atraída pela beleza dos vulcões.



sábado, 3 de março de 2012 1 comments

A vida da gente na vida da gente

A vida da gente começou na semana seguinte ao derrame da vovó. Fazia muitos anos que não assistia a uma novela, mas a história das jovens irmãs me cativou. Nos primeiros capítulos, pela atmosfera de seriado, com personagens jovens, entrando na faculdade. Mas o que parecia um entretenimento bonitinho, tornou-se angustiante com o acidente que levou Ana ao coma. Nos corredores do hospital (da minha vida real), já se comentava que ela sairia do coma após cinco anos -- acho que as pessoas liam as revistas só para terem certeza de que, pelo menos na novela, haveria um final feliz.

Vovó voltou para casa exatamente no mesmo dia em que Ana mexeu a mão. Emotivas como estávamos, mamãe e eu choramos juntas. Pela vovó? Pela Ana? Pela vida da gente, enfim...

Em que pese minha tendência a gostar de um drama, identifiquei-me com a narrativa. Como na vida da gente, os vilões não eram cruéis e sanguinários, mas apenas pessoas obsessivas, que no fundo tentam fazer o que acham certo. Como na vida da gente, o amor da adolescência não é necessariamente o mesmo amor da vida toda (e esse nem precisa existir). E como na vida da gente, o final feliz não acontece com festas de casamentos, batizados, etc, mas com um simples passeio no parque.
 
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