Muitos e muitos anos atrás, Ulysses partiu e levou vinte anos para retornar à casa em que Penélope lhe aguardava... Vinte anos lutando as mais duras batalhas, vinte anos vendo a morte, lidando com decepção e ódio. Na história grega, o retorno é celebrado, é festivo. Mas o que de fato acontece após vinte anos vivendo os horrores de uma guerra? Vinte anos depois de conviver com a morte, ou com a loucura, ou com a tristeza?
Há um conto japonês que trata exatamente de um homem que regressa da guerra, regressa de conhecer o pior lado da humanidade. Ao chegar, sua esposa o recebe com festa, alegria, boa comida, e com toda exuberância da mulher que, apesar do passar dos anos, se manteve bela e tão apaixonada (ou mais!) quanto a menina de dezesseis anos.
O primeiro encontro é celebrado junto ao mar. No momento exato em que se veem depois de vinte anos, os olhos voltam a brilhar, o coração palpita, é impossível manter a seriedade que se espera de duas almas que, após vinte anos, deveriam se comportar como amigos que não se veem há tanto tempo. Junto ao mar, longe de todas as guerras, longe da realidade, a única coisa que importa é curtir aquele momento, eternizá-lo. E cada toque lembra uma intimidade que nunca foi possível com nenhum dos amores que o sucederam.
Ainda que mágico, ainda que revelador de uma sintonia incrível, era apenas um final de semana. Nos dias que se sucederam, o homem decide retornar à guerra. Talvez por culpa, medo, fuga, não importa... Durante algum tempo, a mulher continua a enviar cartas, tenta dizer para si mesma que o amor é construído de paciência, persistência, permanência, paixão e perdão. A cada carta, porém, a ferida reabre... Então, para continuar vencendo as batalhas de cada dia, as batalhas que têm vencido sozinha nos últimos vinte anos, a mulher, ainda que dolorosamente, decide diminuir a frequência das cartas, até que se silencia. Não porque deixou de se importar, mas porque foi percebendo que era uma questão de sobrevivência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário